Meus amigos, o paraíso é aqui. Encravado na Serra da Canastra, MG, está um pedaço do céu. Embora o Brasil seja fértil em paisagens, essa em particular se apresenta com uma beleza de encher os olhos e lavar a alma.
Cansado da mesmice do Carnaval, resolvi aceitar a dica de um amigo e parti rumo aos paredões de Minas e, definitivamente, não me arrependi.
A parada obrigatória para pegar a balsa que atravessa de Passos para São João Batista do Glória é uma delícia. Perdi três travessias só pelo prazer de descansar o corpo e a mente num dos vários bares e restaurantes que se encontram às margens da represa do Peixoto, tanto em Passos como no Glória, como é chamado pelos locais.
Até ali, tudo bem, as estradas são de pista única, mas em bom estado de conservação, apesar de alguns trechos deficitários. Por isso, sugiro uma viagem durante o dia.
A partir do Glória, a aventura realmente começou. Foram 40 quilômetros que se transformaram em 60 por conta de uma bifurcação. Aliás, muito cuidado com as bifurcações. Preste atenção nas indicações e você certamente não cairá na mesma roubada que eu caí. Mesmo porque todo mundo sabe que alcançar o paraíso é para poucos.
Finalmente localizei algumas placas, peguei o rumo certo e cheguei ao vilarejo de Ponte Alta. Pausa para descansar e se refrescar numa das vendas mais peculiares que já encontrei e que mais tarde descobri ser uma constante por aquelas paragens. Mais nove quilômetros de terra e avistei a placa da salvação: Fazenda Santo Antônio.
O alívio foi geral e a surpresa maior ainda quando me deparei com o primeiro riacho de água cristalina que, sem ponte, o carro teria que atravessar. Não tive nem um minuto de hesitação: desci e me refresquei naquela água abençoada. Segui em frente e, logo após o canavial, o prêmio.
A fazenda está encravada aos pés da Serra Preta, uma cadeia de montanhas que faz parte da Serra da Canastra. O visual é impressionante. São quilômetros de pastos delimitados por um paredão imenso e fendas com abismos que escondem cachoeiras, muitas cachoeiras. Bom, elas são um capítulo à parte.
Voltando à fazenda, fui simpaticamente recebido pela Sílvia, a proprietária, e pela Rô, a caseira, cozinheira e muito mais.
Colônia
Minha casa, a que aluguei, era deliciosa. No mais autêntico estilo colônia mineira, era simples e confortável. Detalhe, a paisagem que se revelava através da janela do banheiro valeu pela acomodação.
No dia seguinte, após banho, jantar e merecido descanso, recarreguei as baterias com café da manhã regado a pão de queijo e doce de leite e rumei para a primeira das três cachoeiras que conheci no lugar. Equipado com meu kit básico, aquele tipo frutas, canivete, repelente e protetor solar, fiz uma caminhada de uns 40 minutos, morro acima e morro abaixo, até escutar aquele som mágico: água.
A Cachoeira do Lobão me encantou à primeira vista. Pedras imponentes em tons que vão do mais claro areia ao mais escuro laranja e a água mais cristalina que já vi jorrar de dentro de uma montanha. Foi uma festa. Mergulhei na piscina natural e, não contente, escalei até o topo para encontrar um canyon profundo e estreito por onde jorrava um jato de água impressionante. Passei o dia entre banhos de sol e de água fria, mas revigorante, e chegando em casa fui recebido com almoço/jantar com sabor de fogão à lenha e um pôr-do-sol que deu as boas vindas a um céu tão estrelado e de uma dimensão que chegava a ser assustadora.
Gastei o fim de noite sentado na varanda da casa principal, juntamente com o Luca, o dono da fazenda, e alguns amigos, balançando na rede, observando as crianças correndo livres, rindo e curtindo o balanço rústico feito na árvore. Nada de TV, nada de axé ou funk, nada de espelhos. Dormi cedo ao som de grilos e sapos, com o sorriso pregado no rosto e os mais tranqüilos sonhos.
Fendas
No dia seguinte, segunda aventura. Eu, como corredor inveterado, parti às seis da manhã acompanhado de uma fiel escudeira canina, e juntamente com o sol nascendo, peguei a estrada, novamente morro acima morro abaixo, e segui para a Cachoeira do Luquinha.
Depois de 30 minutos de corrida e caminhando pela trilha alcancei o tão desejado objetivo. Mais uma queda d`água, maior e mais impressionante que a outra, embora até então eu não achasse isso possível. Numa altura delirante, aproveitei para explorar cada piscina, poço, queda e pedra daquele lugar onde tudo, absolutamente tudo, está em perfeita harmonia.
Não dá para descrever a sensação de estar no topo do mundo, dentro de uma daquelas fendas que eu havia observado de longe ao longo da estrada, e aproveitar para repor todas as energias gastas, sem exagero, numa vida. Realmente, você renasce naquele lugar. Nessa noite, nada cansado e, ao contrário, revigorado, resolvi ir para o vilarejo de Olhos D`água (não é um nome maravilhosamente poético?), afinal, era carnaval.
Já na chegada, outra surpresa. Silêncio absoluto e nada de luz, a não ser de algumas velas nas mãos de crianças fantasiadas e maquiadas, que davam um ar pitoresco e fantasmagórico ao local e, claro, novamente aquele absurdo de estrelas.
Tudo bem, sentei no boteco da esquina, acendi uma vela, tomei uma cervejinha e curti a noite de carnaval mais autêntica que eu podia imaginar.
O terceiro e último dia foi o da cavalgada. Devidamente paramentado, segui, aos cuidados do guia André e minha nova amiga Teresa, por uma hora e meia rumo à Cachoeira do Urubu, que tentaram transformar em Cachoeira do Juju, mas não pegou, pelo menos não para mim. Depois da ótima cavalgada, cheguei a um riacho, pelo qual subimos sem trilha e praticamente por dentro da água, até atingirmos fenda de uns 60 metros de altura. Novamente a natureza me surpreendeu. Lá do alto, escorria uma cortina de água até cair num poço, que eu não soube avaliar a profundidade, com uma força e uma beleza de tirar o fôlego.
E naquele lugar imponente também me dei conta da nossa fragilidade, porque pequenos descuidos podem se transformar em grandes problemas. Um mínimo escorregão, uma pedra no caminho e seu programa vai por água abaixo. Portanto, cuidado! A natureza exige respeito.
Ao voltar, só tinha uma coisa a fazer: juntar minha bagagem, carregar o carro e partir. A tristeza bateu, é claro. Todos se despediram com calor e verdadeiro carinho. Já na estrada, minha tristeza foi gradativamente se transformando em realização e um sorriso satisfeito me escapou quando me dei conta de que aquele é apenas um dos milhares de paraísos que estão escondidos ao nosso redor, em nosso País e até mesmo em nosso planeta.
Esse pensamento me animou e imediatamente comecei a planejar minha próxima aventura. Até lá, vou guardando a emoção única de ter estado num pedaço do céu.
Dados Importantes
COMO CHEGAR
Há muitas maneiras, mas optei pelo caminho que passa por Pirassununga, Santa Cruz das Palmeiras, Casa Branca, Mococa, São Sebastião do Paraíso, Passos e São João Batista do Glória. A partir daí, estrada de terra, 26 quilômetros até Ponte Alta e mais nove quilômetros até a sede da fazenda. Boa sorte!
ONDE FICAR
Fazenda Santo Antônio
Tel.: (35) 9981-5353 com Rô ou (11) 5182-0160 com Luca
QUANTO CUSTA
O valor é de R$ 15,00, com café da manhã e mais R$ 5,00 o almoço/jantar.
MOCHILA
Além de roupas simples e confortáveis, uma bota ou tênis e um bom livro. Repelente, protetor solar e boné não podem faltar. Leve também uma geladeira, pode ser aquela de isopor, porque na casa não tem.
Atenção: Um kit de primeiros socorros deve ser o primeiro item da sua bagagem. Todos têm um toque pessoal, monte o seu com cuidado e evite dores de cabeça.
Dica: Vitamina C, anti-séptico, esparadrapo, analgésico, cicatrizante, gaze, antiácido, curativo, pomadas para queimaduras, picadas e assaduras, repelente, antialérgico e tesoura.
DICA
Se você, por algum azar ou descuido precisar de assistência médica, vá direto para Delfinópolis, a 35 quilômetros da fazenda. O hospital municipal é bem equipado e a equipe médica atenciosa e preparada.
Autor: João Mauro.
E-mail: johnnymau@bol.com.br
Cidade/UF: Serra da Canastra – MG
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