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Salvando o Parque Nacional das Emas

Parque Nacional das Emas
Parque Nacional das Emas

Em paisagem tão castigada, é difícil imaginar a existência de onças. “Mas elas estão lá, no limite da sobrevivência”, diz o biólogo Leandro Silveira, apontando o mato à frente, enquanto percorre, no volante de uma caminhonete, os caminhos esburacados rumo às nascentes do rio Araguaia. “Por isso, essa região é tão importante para salvar a vida do cerrado.” Olhando o cenário, percebe-se o tamanho do desafio: cultivos de milho estendem-se a perder de vista dos lados da estrada. Aviões em vôos rasantes pulverizam plantações contra pragas. É a força do eldorado agrícola que produz alimentos, gera emprego e riqueza, mas causa impactos no ambiente natural.

Estamos no entorno do Parque Nacional das Emas, um dos refúgios silvestres mais importantes do cerrado brasileiro. O lugar ganhou o título de Patrimônio Natural da Humanidade, conferido pela Unesco. No entanto, “é uma área muito sensível a alterações da natureza”, como afirma Leandro, diretor do Instituto para a Conservação da Onça Pintada. Para ilustrar o motivo de sua preocupação, ele para a caminhonete na fazenda Jacuba, a 600 metros do parque. Desce uma trilha e aponta para os estragos: gigantescas fendas de 20 metros se abrem no solo, resultado da erosão causada pela passagem do gado. O barro escorre diretamente por onde nasce o Araguaia.

Mais adiante, ele aponta uma das três nascentes do rio. Até bem pouco tempo uma fonte límpida, hoje suas águas apresentam manchas pardas. Sem cerca ou qualquer proteção, está aberta ao acesso do gado, que se aproxima para matar a sede. A destruição dessas fontes coloca em risco o ambiente no qual ainda se mantém um dos poucos trechos de mata nativa de cerrado fora dos parques e reservas biológicas.

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Corredores de biodiversidade

A região ameaçada é peça importante na montagem de um difícil quebra-cabeças: como planejar e criar corredores de biodiversidade capazes de garantir, aos animais que habitam o Parque Nacional das Emas, o trânsito para áreas nativas das vizinhanças e até locais mais distantes. O parque é um divisor de águas continentais e, seguindo a trilha dos rios, é possível encontrar caminhos para a fauna. Pela bacia do Araguaia e de suas áreas conservadas, chega-se à Floresta Amazônica, mais ao norte. Há duas outras alternativas de corredores em estudo: uma destinada a unir o parque ao Pantanal, no Mato Grosso do Sul, seguindo a vegetação ao longo do rio Taquari; e outra em direção à Mata Atlântica, no Sudeste, no percurso das matas próximas ao rio Paranaíba.

Seja qual for o caminho escolhido, a estratégia é urgente porque o parque está hoje isolado. Trata-se de um refúgio natural, sufocado por grandes cultivos agrícolas e – quando existem – suas reservas legais ou áreas preservadas das fazendas, que devem cobrir obrigatoriamente 20% da propriedade. O problema é que, dependendo da localização e do tipo de vegetação, essas áreas verdes privadas nem sempre se ligam ao parque de modo a contribuir para a dispersão e o equilíbrio das espécies. Sem corredores de trânsito, é grande o risco da morte de animais no caso de incêndios – algo muito comum na região.

O objetivo então é aumentar as atuais reservas das fazendas e criar novas, de forma a transformar novamente em cerrado as áreas que foram convertidas à agricultura. Só assim, os corredores poderão promover o fluxo genético entre indivíduos de uma mesma espécie. Com mais áreas, esses animais podem cruzar em diferentes famílias e se reproduzir de maneira mais saudável, evitando a extinção.

Trabalho em cooperação

“O papel dos proprietários rurais é decisivo nesse tipo de trabalho”, observa Leandro. A sede da instituição que ele dirige está situada ao lado da entrada do Parque Nacional das Emas. Ela foi responsável pelo mapeamento de 54 propriedades em um raio de 50 quilômetros do parque. São, em sua maioria, latifúndios, com média de 2.500 hectares. A partir desse levantamento, que contou com o apoio da empresa Monsanto, os fazendeiros estão sendo mobilizados para participar de expedições promovidas pelos biólogos, destinadas a conhecer a realidade do parque e de seu entorno – a beleza da paisagem, a biodiversidade, as ameaças às espécies.

A idéia que norteia esse projeto é mostrar que a agricultura pode conviver com os programas de conservação do cerrado sem prejudicar a produção das fazendas. Na verdade, pode até ajudar, ao contribuir para o equilíbrio do clima, o acesso à água limpa e à preservação do solo. “Quando mostramos a riqueza natural existente no quintal de suas fazendas, queremos conscientizar os fazendeiros para que eles também se transformem em líderes ambientais”, diz o biólogo. “O sucesso dos corredores de biodiversidade depende disso.”

Dados do Ibama, colhidos nas 184 propriedades rurais da região, revelam que apenas 31% das fazendas obedecem à lei e possuem reservas naturais averbadas e bem preservadas. “É preciso mostrar como eles devem agir e estabelecer um pacto”, afirma Ary Soares dos Santos, superintendente do Ibama em Goiás. Como parte do projeto Prolegal, conduzido por ele, os fazendeiros são notificados sobre as condições de suas reservas e, dentro de um ambiente de diálogo, ganham um prazo para adequá-las às normas. Ele observa que isso é necessário porque, muitas vezes, os problemas de regularização das reservas ocorrem por falta de informação. Flagrantes e multas apenas não resolvem. “Não podemos transformar um passivo ambiental em passivo judicial, sob o risco de as questões irem parar no tribunal e nenhuma medida de conservação ser colocada em prática efetivamente”, explica.

A fauna resiste no parque

Se as reservas não forem estabelecidas como manda a lei e de forma a contribuir para a existência dos corredores, a preservação do cerrado fica difícil. Sobrou pouca área livre, pois a vegetação nativa que cobre os municípios de Mineiros e Chapadão do Céu, no entorno do parque, está reduzida a menos de 10% do original – e boa parte pertence à área das unidades de conservação. Com as terras supervalorizadas pelo agronegócio, será preciso um alto grau de conscientização para que os fazendeiros se preocupem em preservar a vegetação original. “Diferentemente do que ocorre na Floresta Amazônica, a estratégia no cerrado não é evitar danos (porque eles já aconteceram), mas remediá-los”, afirma o chefe do parque, Rogério Oliveira de Souza.

O Parque Nacional das Emas abriga variados tipos de paisagem em seus 132 mil hectares. Ali podem ser encontrados de campos abertos, que cobrem a maior parte do território, até matas densas existentes nas encostas dos chapadões. Em suas imediações, já foram registradas 17 das 25 espécies mais ameaçadas de extinção do cerrado. Entre elas, aves raras como o tié-bicudo, que, aliás, já tinha sido dado como extinto e foi reavistado em 2004.

Além disso, o parque abriga espécies de megafauna, como onças, veados-campeiros, antas, lobos e tamanduás – todos ameaçados pelo isolamento e perda do hábitat resultado da fragmentação do bioma cerrado. Muitos desses animais, com pouco espaço para ir e vir, cruzam as estradas e são vítimas de atropelamento. A caça, a pesca predatória e a contaminação do ambiente por defensivos agrícolas completam o quadro de ameaças.

Mais recentemente, os biólogos do Ibama e do Instituto adicionaram uma nova preocupação à lista: o avanço da cana-de-açúcar no cerrado. “Há risco dessa cultura de plantas altas barrar ainda mais o trânsito dos animais”, observa a pesquisadora Natália Mundim Torres, especialista no estudo das onças-pintadas e da sua distribuição nas Américas. No Parque Nacional das Emas foram registrados entre 30 e 40 animais. Teme-se que, sem espaço para se expandir, essa espécie resista ali por mais 50 anos. Mas Natália está otimista. “Não podemos trabalhar apenas no parque. Temos de atuar no entorno também.” Os fazendeiros, segundo ela, estão aberto ao diálogo. Há chances de reverter as ameaças.

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O reino das onças-pintadas

O Parque Nacional das Emas, criado em 1961, tem o nome inspirado nessas aves de gracioso gingado que transitam ali e também nas extensas plantações de soja, milho e algodão. Mas são as temíveis onças-pintadas que reinam no lugar. Elas têm o prestígio de ser os maiores carnívoros das Américas. E por estarem no topo da cadeia alimentar, essas predadoras são como espécies “guarda-chuvas”. Se for possível preservá-las, certamente se poderá preservar todo o ambiente onde vivem. Sensíveis, as onças-pintadas precisam de bons padrões ecológicos para viver. São, por isso, consideradas um termômetro da preservação de um parque ou de uma reserva.

O Instituto para a Conservação da Onça-Pintada mantém 16 projetos envolvendo a espécie no Brasil. O centro das atenções, porém, fica no Parque Nacional das Emas. É onde os pesquisadores instalaram 230 câmeras fotográficas com sensores de calor em diferentes paisagens para flagrar o deslocamento dos animais dentro e fora da área protegida. As onças podem andar mais de 40 quilômetros em um dia e meio, principalmente ao longo dos rios, acompanhando a vegetação nativa. Essa necessidade de espaço retrata a importância dos corredores de biodiversidade para a sobrevivência da espécie.

Os estudos também visam conhecer o comportamento e a reprodução das onças-pintadas, uma das 16 espécies de carnívoros que vivem no parque. Para que sejam acompanhadas, as onças são capturadas e recebem coleiras, com as quais são monitoradas pelo sistema de radiotelemetria. A operação de captura exige o uso de dardos com anestésico e cães treinados para farejar as fezes do animal nas matas. As fezes também são analisadas em laboratório para revelar o nível de hormônio associado ao stress, indicador das condições de vida no parque.

A marca do parque

Estima-se que existam mais de 2,5 milhões de cupinzeiros dentro do Parque Nacional das Emas. Esses montes de terra construídos por cupins podem alcançar até 2 metros de altura e são uma marca registrada do local. Além de servir de casa para seus construtores, fornecem abrigo para muitos outros animais, como corujas-buraqueiras, periquitos, cobras, tatus e formigas. Nos meses de setembro e outubro, início das chuvas, os cupinzeiros hospedam larvas de uma espécie de besouro que emite uma intensa luz esverdeada, transformando a paisagem em campos luminosos à noite.

As opções do cerrado

Os estudos apontam três possíveis corredores para garantir o trânsito dos animais: um para a Floresta Amazônica, outro para o Pantanal e o terceiro para a Mata Atlântica.

Ficha técnica

Parque Nacional das Emas
Criação: janeiro de 1961
Área: 131.868 hectares
Localização: Mineiros (sudoeste de Goiás)

Veja aqui o folheto sobre o Parque das Emas:
PDF Parque das emas

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Escrito por Mauricio Oliveira

Maurício Oliveira é social media expert, consultor e influenciador de turismo e empreendedor. CEO do portal Trilhas e Aventuras, também conta suas experiências de viagens pessoais no blog Viagens Possíveis. Especialista em Expedições na Rota das Emoções e Lençóis Maranhenses. Ama o que faz no seu trabalho e nas horas vagas também gosta de viajar. Siga no Instagram, curta no Facebook, assista no Youtube.

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